Em um cenário fiscal cada vez mais pressionado, os números revelam uma realidade incômoda: o governo brasileiro gasta mais do que arrecada. Enquanto a arrecadação federal ainda gira em torno de R$ 2,37 trilhões em 2025, os gastos públicos já ultrapassam a marca de R$ 3,12 trilhões, gerando um déficit de aproximadamente R$ 750 bilhões.
Esse desequilíbrio não é novo — mas tem ganhado novas formas de exposição e cobrança por parte da sociedade. Em um esforço por ampliar a transparência fiscal e promover o controle social, iniciativas como o Gasto Brasil e o tradicional Impostômetro vêm ganhando visibilidade em diversas capitais.
A mais recente novidade veio de Porto Velho (RO), que inaugurou no dia 31 de julho o primeiro painel de LED da Região Norte, exibindo em tempo real os dados da arrecadação e do gasto público federal. A ação é liderada pela Associação Comercial e Empresarial de Porto Velho (Acep), inspirada em projetos da Associação Comercial de São Paulo (ACSP) e da Confederação das Associações Comerciais e Empresariais do Brasil (CACB).
“A gente já tinha essa vontade antiga de proporcionar uma ferramenta de transparência para a sociedade porto-velhense e rondoniense. Quando soubemos que o
Impostômetro havia completado 20 anos e que o Gasto Brasil estava sendo lançado, resolvemos implementar esse painel aqui na sede da ACEP. A ideia é justamente gerar impacto visual, tornar o debate acessível e fazer parte do cotidiano das pessoas”, afirmou Valdir Vargas, presidente da Acep.
Instalado em frente à sede da entidade, o painel busca estimular a curiosidade e o engajamento da população no debate sobre os recursos públicos.
“Foi oportuno o lançamento ter acontecido justamente na semana em que o Gasto Brasil atingiu a marca dos R$ 3 trilhões. Quando se olha para o Impostômetro, a arrecadação estava na casa dos 2,3 trilhões. Ou seja, um déficit de 700 bilhões. Isso gera um alerta, chama a atenção e ajuda as pessoas a enxergarem que existe um descontrole fiscal no país”, completou Vargas.
A ferramenta digital do Gasto Brasil, disponível em www.gastobrasil.com.br, permite que qualquer cidadão acesse os dados detalhados dos gastos públicos — da União, dos estados e dos municípios — e acompanhe, por exemplo, os investimentos em saúde, educação, segurança e infraestrutura.
“Nós temos R$ 700 bilhões de déficit. Essa é a questão central. O governo tem no caixa um gasto de 700 bilhões até agora e precisa se financiar no mercado — por isso, a taxa de juros está na ordem de 15% e não consegue diminuir. [...] Isso é culpa da má gestão, que deveria começar a cortar gastos para minimizar o déficit e abrir espaço para a redução dos juros”, alertou Alfredo Cotait, presidente da CACB.
Para ele, o Gasto Brasil é também um instrumento de cidadania, pois oferece elementos concretos para que a população fiscalize a gestão pública e cobre mais eficiência no uso dos recursos, em vez de aceitar novos aumentos de impostos.
“Como não há apetite para cortar gastos — esse não é o perfil do governo — querem aumentar impostos. Mas não há mais de onde tirar. Ninguém aguenta mais. E isso afugenta investimentos. Está cada vez mais difícil para o empreendedor empreender neste país”, concluiu Cotait.
A repercussão do painel em Porto Velho já começa a se espalhar. Segundo Valdir Vargas, moradores do interior de Rondônia começaram a procurar a associação perguntando quando o painel será instalado em suas cidades.
“A gente acredita que isso gera um movimento muito saudável de cidadania participativa. Recebemos mensagens de pessoas de municípios do interior perguntando: ‘Quando vai ter aqui também?’ Isso mostra que a iniciativa tem potencial de reverberar para outras regiões e incentivar a cobrança por parte da população”, afirmou.
A iniciativa busca ampliar a transparência sobre as contas públicas, oferecendo dados acessíveis à população. Em um contexto de déficit fiscal crescente, o acesso a informações claras sobre arrecadação e gastos é um elemento essencial para o acompanhamento e controle social da gestão pública.
Cinco municípios brasileiros estão atualmente bloqueados de receber os recursos do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), de acordo com informações do Tesouro Nacional, com dados atualizados até o último dia 5 de agosto. As cidades permanecem impedidas de receber os repasses até que resolvam pendências legais, fiscais ou previdenciárias junto à União.
Segundo o assessor de orçamento César Lima, os prejuízos financeiros podem ser expressivos ao longo do ano. “Eles vêm perdendo recursos consideráveis durante o ano e devem procurar regularizar sua situação, seja ela previdenciária, seja por conta de algum crédito não pago e que tenha o aval do governo federal”, pontua.
Entre os municípios com bloqueio vigente, dois estão no estado do Rio de Janeiro: Cabo Frio e Barra do Piraí. Cabo Frio, localizada na Região dos Lagos e com cerca de 238 mil habitantes, está impedida de receber os repasses do FPM desde 8 de janeiro de 2025, segundo o Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi) do Tesouro Nacional.
Neste decêndio, o município deixará de receber cerca de R$ 3,5 milhões. Considerando uma estimativa anual, a cidade poderia perder mais de R$ 100 milhões em repasses do fundo — recurso fundamental para o custeio de serviços públicos como saúde, educação e infraestrutura.
Embora também tenha recebido, em 2024, cerca de R$ 388 milhões em royalties do petróleo, os valores do FPM ainda representam uma fatia significativa do orçamento municipal. Pela legislação federal, os royalties devem ser obrigatoriamente destinados 75% à Educação e 25% à Saúde, o que limita o uso desses recursos em outras áreas.
A reportagem do portal Brasil 61 entrou em contato com a Prefeitura de Cabo Frio, mas até o fechamento desta matéria não obteve resposta.
Além de Cabo Frio (RJ) e Barra do Piraí (RJ), também estão com repasses do FPM bloqueados os municípios de:
Os bloqueios são temporários e, segundo o Tesouro Nacional, assim que os municípios regularizam suas pendências, o repasse dos valores é retomado normalmente.
O repasse do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), feito a cada dez dias pela União, será depositado nesta sexta-feira, 8 de agosto, para os 5.570 municípios brasileiros. O valor da primeira parcela do mês soma R$ 7,3 bilhões, representando um crescimento em relação ao mesmo período do ano passado, o que é positivo para as finanças das cidades, avalia o assessor de orçamento, César Lima.
"Temos um crescimento em relação ao mesmo período no ano passado na casa dos 3%, o que é muito interessante e confirma a um bom andamento do FPM neste ano de 2025”, destaca.
Veja abaixo quanto seu município vai receber de FPM:
Os estados de São Paulo e Minas Gerais concentram juntos cerca de um quarto do valor total repassado no primeiro decêndio de agosto. Os municípios paulistas recebem 14,2% do total, o que equivale a R$ 911 milhões. Em seguida, estão os municípios mineiros, com 14,1%, somando R$ 906 milhões.
Entre as prefeituras paulistas que recebem os maiores valores estão São José dos Campos, Marília e Limeira. No estado mineiro, as maiores quantias serão destinadas a municípios como Santa Luzia, Ribeirão das Neves e Poços de Caldas.
Na outra ponta, o estado de Roraima, que possui apenas 14 municípios, representa 0,08% dos repasses, com R$ 5,4 milhões depositados neste decêndio.
Até o último dia 5 de agosto, 5 municípios estavam impossibilitados de receber valores do FPM. Esse impedimento pode ser causado por algum débito ou falta de documentação. Confira a lista das cidades:
O Fundo de Participação dos Municípios (FPM) é uma das principais fontes de receita das prefeituras brasileiras, especialmente nas cidades de pequeno e médio porte. Formado por uma parcela da arrecadação do Imposto de Renda (IR) e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), o fundo tem como objetivo reduzir desigualdades regionais e garantir recursos mínimos para a manutenção dos serviços públicos essenciais.
A divisão dos valores é feita com base em critérios populacionais e técnicos definidos pelo Tribunal de Contas da União (TCU). Na prática, o FPM é usado para custear áreas como saúde, educação, assistência social e infraestrutura, além de contribuir para o pagamento de salários e despesas administrativas nos municípios.
Representantes do governo federal, entidades de classe e do setor produtivo se reuniram nesta terça-feira (5) na sede da Associação Comercial de São Paulo (ACSP) para debater estratégias de ampliação das exportações brasileiras, com foco especial nas micro e pequenas empresas (MPEs), que hoje representam apenas 0,8% do valor exportado pelo país, embora respondam por cerca de 40% dos exportadores.
O encontro contou com a presença do embaixador Laudemar Aguiar Neto, secretário de Promoção Comercial, Ciência, Tecnologia, Inovação e Cultura do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), que destacou a importância de proteger e apoiar os pequenos negócios diante das recentes barreiras comerciais adotadas contra produtos brasileiros. “Estamos falando de barreiras disfarçadas, verdadeiras sanções. Essa situação é inédita e exige ações coordenadas”, afirmou.
Entre os principais pontos discutidos, estiveram o fortalecimento da cadeia produtiva nacional por meio da agregação de valor aos produtos exportados — como o exemplo do café, setor que emprega 2 milhões de brasileiros e que, em sua maior parte, ainda sai do país em grão verde, ou seja, com pouco valor agregado — e a diversificação dos destinos das exportações brasileiras. “Desde 2009, a China é o nosso principal parceiro comercial, com destaque para petróleo, minério de ferro e soja. Mas é urgente expandir para além da China e dos Estados Unidos”, completou o embaixador.
"Nós temos feito um grande esforço, o Itamaraty junto com MDIC, Apex e outros órgãos para ampliar e diversificar a nossa pauta exportadora e o caso mais emblemático é o da Embraer. A Embraer nunca fechou tantos contratos e nunca vendeu tanto quanto nos últimos anos. A perspectiva, dependendo do que acontecer com os Estados Unidos, continua sendo positiva", destacou o diplomata.
Acordo Mercosul–União Europeia
A CACB e a Associação Comercial de São Paulo anunciaram ainda a estruturação de uma força-tarefa conjunta com entidades como a Fecomércio, Sebrae e o MDIC para promover ações de informação e orientação aos pequenos empresários sobre riscos e oportunidades no comércio exterior.
Para ajudar o pequeno e médio empresário a compreender melhor os impactos do Acordo de Livre Comércio entre o Mercosul e a União Europeia — que está em fase final de negociação e deverá ser ratificado em breve pelos parlamentos dos países dos dois blocos —, o presidente da CACB, Alfredo Cotait, destacou a importância de ampliar o acesso à informação:
“A gente tem que estar muito próximo dessas discussões, acompanhar e verificar o impacto que isso pode trazer, benéfico ou não para os pequenos. Então, nós estamos organizando uma ação conjunta com outras entidades para poder acompanhar”, disse Cotait.
O acordo prevê a criação de uma zona de livre comércio entre Mercosul e União Europeia, com eliminação gradual de tarifas e barreiras não tarifárias, além de mecanismos de cooperação em áreas estratégicas. Entre os principais objetivos do tratado estão:
• Redução de tarifas: diminuição ou eliminação das tarifas de importação para a maioria dos produtos, o que pode gerar economia para empresas e consumidores;
• Abertura de mercados: acesso ampliado a mercados europeus para empresas brasileiras e vice-versa;
• Cooperação multissetorial: em temas como serviços, investimentos, compras públicas, propriedade intelectual, defesa da concorrência, meio ambiente, energia e direitos humanos;
• Previsibilidade e segurança jurídica: com regras claras e transparência para empresas dos dois blocos;
• Promoção do desenvolvimento sustentável: conciliando crescimento econômico com responsabilidade ambiental e social.
A expectativa é que, com a entrada em vigor do acordo, aproximadamente 90% dos produtos comercializados com o mercado europeu passem a ter tarifa zero. Ainda assim, representantes da indústria apontam que os benefícios para o setor produtivo brasileiro podem ser limitados, devido à baixa competitividade em relação a produtos industrializados — com exceção do agronegócio, que segue como o principal beneficiado.
Nesse cenário, foi sugerido que o Brasil identifique, dentro da primeira cesta de produtos que terão tarifa reduzida, aqueles com maior potencial de aproveitamento pelas pequenas e médias empresas.
Um dos principais desafios debatidos foi o acesso das MPEs ao mercado externo. Como alternativa, representantes do governo e das entidades presentes defenderam o fortalecimento das chamadas missões compradoras — nas quais compradores estrangeiros vêm ao Brasil para fechar negócios in loco, o que reduz custos e barreiras logísticas para os empresários locais. Um exemplo de sucesso citado foi de um acordo firmado no ano passado com uma gigante asiática do café, cuja atuação com o mercado chinês permitiu dobrar o volume exportado de 120 mil para 240 mil toneladas no ano passado.
Outro destaque da reunião foi a apresentação do FUNPEX, um fundo de financiamento voltado exclusivamente a custear passagens e hospedagens de micro e pequenas empresas selecionadas para participar de projetos de exportação, mas que não têm recursos próprios para isso. A iniciativa, de gestão público-privada, será coordenada pela ApexBrasil e pelo Sebrae, com estrutura multissetorial e participação de CACB, MDIC e outras instituições.
A proposta já conta com minuta de decreto, regimento interno, modelo de edital de convocação e plano de captação de recursos internacionais. A ideia é garantir que o empreendedor de menor porte tenha as condições necessárias para acessar mercados externos.
“Quando uma pequena empresa passa a exportar, ela melhora sua capacidade produtiva, aumenta os salários dos seus empregados e fortalece o ecossistema local. É um movimento transformador”, reforçou o embaixador Laudemar Aguiar.
O encontro reafirmou o compromisso das entidades com uma política comercial mais inclusiva, que permita ao Brasil crescer de forma sustentável, fortalecendo suas pequenas empresas e ampliando sua presença no cenário internacional.
A decisão do governo dos Estados Unidos de impor tarifas adicionais sobre uma ampla gama de produtos brasileiros reacendeu o alerta no setor produtivo nacional. A medida, que começa a valer em 6 de agosto, impõe alíquotas de até 40% sobre boa parte das exportações — em alguns casos, somadas a uma tarifa de 10% já vigente desde abril. O impacto é especialmente preocupante para setores como carnes, café, frutas secas, máquinas e equipamentos e produtos químicos, que já enfrentam desafios de competitividade internacional.
Para a Confederação Nacional da Indústria (CNI), o cenário ameaça o fluxo de exportações para um dos principais parceiros comerciais do Brasil, colocando em risco cadeias produtivas integradas, empregos e investimentos bilaterais. Em entrevista, a gerente de Comércio e Integração Internacional da entidade, Constanza Negri, avaliou que, apesar de exceções pontuais na nova política tarifária, mais da metade das exportações brasileiras aos Estados Unidos ainda será afetada pelas alíquotas elevadas.
“Mais de 50% das nossas exportações seguirão sujeitas às novas tarifas. No caso do setor de proteínas, por exemplo, a alíquota pode ultrapassar 70%, o que é praticamente proibitivo. Estamos falando de um impacto direto em setores fundamentais como carnes, café e frutas secas, que devem ser prioridade nas negociações entre os governos”, afirma Constanza.
A especialista lembra que o setor de máquinas e equipamentos, relevante na pauta industrial brasileira com os EUA, teve parte dos produtos isentados, mas com uma limitação significativa: a isenção só vale para equipamentos destinados à aviação civil.
Estudo citado por Constanza e conduzido por pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) projeta que um cenário generalizado de aumento tarifário — como o que começa a se consolidar — pode provocar perdas de até R$ 20 bilhões no PIB brasileiro, além de impactar diretamente cerca de 70 mil empregos, sendo 30 mil na indústria e 40 mil no agronegócio.
“Mesmo com as exceções anunciadas, esse estudo dá um norte do tamanho do prejuízo. O mercado americano é o principal destino das exportações industriais brasileiras. Cada bilhão de dólares exportado para lá gera, em média, 24 mil empregos diretos no Brasil”, ressalta a gerente da CNI.
Entre os setores mais atingidos pela nova rodada tarifária está a indústria química, que vê ameaçada uma relação de décadas com os Estados Unidos. Segundo a Abiquim (Associação Brasileira da Indústria Química), os EUA aplicaram uma tarifa adicional de 40% sobre a maioria dos produtos químicos brasileiros, o que, somado à alíquota de abril, resulta numa carga tarifária de 50%.
O impacto é direto sobre US$ 1,7 bilhão em exportações, que representam cerca de 70% do total vendido pelo setor químico brasileiro aos EUA em 2024. Apenas cinco produtos, entre 50 itens principais, ficaram isentos da nova tarifa. Éder da Silva, gerente de Comércio Exterior da Abiquim, explica que Brasil e Estados Unidos mantêm uma relação estratégica de investimentos, baseada em uma forte integração produtiva.
“Por isso, a Abiquim espera a ampliação da lista de exclusões, com o objetivo de mitigar tanto os impactos diretos quanto os indiretos — especialmente sobre produtos químicos adquiridos no Brasil para o processamento industrial de bens de diversas cadeias produtivas que também exportam para os Estados Unidos, como móveis, têxteis, couros e borracha.”
Além das exportações diretas, a associação já identificou efeitos indiretos em setores dependentes de insumos químicos, como móveis, têxteis e artefatos de borracha, que começaram a sofrer cancelamentos de pedidos de compradores norte-americanos.
A CNI e a Abiquim vêm atuando junto ao governo brasileiro para buscar soluções por meio do diálogo diplomático. Constanza afirma que a entidade seguirá subsidiando as autoridades brasileiras com dados técnicos e apoio aos setores afetados, atuando também como interlocutora com o setor privado americano.
“Sem dúvida, a nossa grande preocupação é em relação aos efeitos negativos na economia brasileira e continuaremos colocando esforços, como CNI, como indústria brasileira, juntos aos setores e às empresas para ser um facilitador junto ao governo americano e ao governo brasileiro e as nossas contrapartes para demonstrar o quão injustificada é essa medida em relação ao Brasil”, reforça a gerente da CNI.
A Abiquim, por sua vez, propõe medidas emergenciais, como a ampliação do Reintegra para 7%, devolução imediata de créditos de ICMS e novas linhas de financiamento à exportação, além de ações conjuntas com a entidade americana do setor, o American Chemistry Council (ACC), para reverter os efeitos das tarifas.
A expectativa das entidades é de que as negociações avancem com base em critérios técnicos e econômicos, e não em decisões unilaterais ou geopolíticas. Para a indústria brasileira, a prioridade no momento é preservar o acesso ao mercado americano em condições justas e evitar retrocessos em uma relação comercial construída ao longo de décadas.
“Não podemos permitir que medidas como essa comprometam os avanços já conquistados. O momento é de união entre governo, indústria e parceiros internacionais para proteger empregos, investimentos e a competitividade do Brasil no cenário global”, conclui Constanza.
Até a última sexta-feira (1º), a Confederação das Associações Comerciais e Empresariais do Brasil (CACB) reuniu, junto às suas entidades filiadas, informações que poderão subsidiar medidas do Governo Federal para enfrentar o chamado tarifaço, imposto pelos Estados Unidos.
A consulta foi realizada com as Associações Comerciais e Empresariais (ACEs) que integram o G50+, um conselho estratégico formado por líderes do sistema associativista com forte atuação institucional. O grupo tem como objetivo fortalecer as relações institucionais da CACB e promover um ambiente privilegiado de networking e articulação de alto nível.
As contribuições recebidas serão encaminhadas ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), que convidou formalmente a Confederação a apresentar propostas que possam subsidiar as ações governamentais diante da nova política tarifária norte-americana.
A nova tarifa de 50% sobre parte dos produtos brasileiros exportados aos Estados Unidos está prevista para entrar em vigor em 6 de agosto e preocupa especialmente a CACB, pelos seus efeitos nas micro e pequenas empresas (MPEs). Embora cerca de 40% dos produtos exportados tenham sido poupados da sobretaxa — já havia sido anunciado um acréscimo inicial de 10% para todos os setores — a medida atinge em cheio as empresas de menor porte.
A lista de exceções inclui 694 itens de setores como o aeronáutico, automotivo, agronegócio, mineração, energia e eletrônicos, além de mercadorias em trânsito ou que serão devolvidas aos EUA.
Mesmo sem estar diretamente na lista dos produtos sobretaxados, muitas micro, pequenas e médias empresas (MPMEs) integram a cadeia produtiva das exportadoras afetadas. Para a CACB, essas empresas devem ser prioridade nas ações de apoio do governo.
“A pequena empresa não tem condição de buscar um mercado alternativo da noite para o dia. Elas não vão conseguir sobreviver com uma taxação de 50%. Isso pode causar desemprego, porque muitas dessas empresas vão fechar as portas”, alerta o presidente da CACB, Alfredo Cotait.
Embora representem apenas 1,2% do volume total exportado pelo Brasil aos EUA, as micro e pequenas empresas cumprem um papel essencial na geração de empregos e no desenvolvimento local. Cotait reforça:
“O problema dos pequenos é muito mais ligado à subsistência e à empregabilidade.”
Após o recesso de julho, o Congresso Nacional retoma suas atividades nesta segunda-feira (4) com uma agenda carregada e marcada por impasses. A prioridade imediata é a votação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), cujo atraso pode comprometer o envio da proposta orçamentária de 2026. Deputados e senadores terão entre os dias 5 e 14 de agosto para apresentar emendas ao texto, que projeta um superávit de R$ 34,2 bilhões e corte progressivo das despesas não obrigatórias.
Além da LDO, a reforma administrativa deve voltar ao centro das atenções. Embora ainda não tenha um calendário definido, o tema é defendido por setores do governo como essencial para destravar o ajuste fiscal. O segundo semestre também começa sob pressão do Supremo Tribunal Federal, que cobrou do Legislativo a regulamentação da licença-paternidade — tema que já conta com propostas prontas para votação na Câmara e em discussão no Senado.
Na Câmara, cresce a expectativa pela possível votação do parecer sobre a cassação da deputada Carla Zambelli (PL-SP). Condenada pelo STF a dez anos de prisão e perda do mandato, a parlamentar ainda aguarda a entrega do relatório na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). O prazo começa a contar com a retomada das sessões plenárias e a decisão pode vir ainda em agosto.
Outro ponto de tensão envolve as moções de apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro, que seus aliados tentaram votar durante o recesso, mas foram impedidos por decisão do presidente da Câmara, Hugo Motta. A oposição promete retomar a articulação nesta semana, pressionando para que as comissões da Casa incluam manifestações formais contra as medidas judiciais impostas a Bolsonaro.
Nos bastidores, parlamentares ligados ao setor produtivo também devem discutir os impactos do tarifaço dos EUA sobre produtos brasileiros. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) já apresentou propostas ao governo para reduzir os danos às exportações e congressistas da Frente Parlamentar do Comércio e Indústria articulam audiências para debater medidas de apoio às empresas afetadas.
Embora gigantes como a Embraer já tenham conseguido derrubar a sobretaxa norte-americana, diversos outros setores produtivos brasileiros permanecem sujeitos à tarifa de 50% (aumento de 40% nas tarifas já existentes, de 10%). Oficializada na última quarta-feira (30), por decreto do presidente Donald Trump, a medida passa a valer em 6 de agosto.
Levantamento preliminar da Secretaria de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Secex/MDIC) aponta que tarifa adicional de 50% incidirá sobre 35,9% das exportações brasileiras para os Estados Unidos. Essa fatia correspondeu a US$ 14,5 bilhões em 2024.
Preocupada com o impacto desproporcional sobre os negócios de menor porte, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) enviou ao governo federal um pacote de oito medidas emergenciais para amortecer o efeito do “tarifaço”. A entidade defende que o momento exige negociação diplomática e políticas internas de apoio às empresas, “e não retaliação”.
“Não há justificativa técnica ou econômica para o aumento das tarifas. Acreditamos que essa medida é uma relação de perde-perde para os dois países”, afirmou o presidente da CNI, Ricardo Alban.
As medidas entregues ao ministro da Indústria e Comércio, Geraldo Alckmin, visam garantir fôlego financeiro e preservar a capacidade exportadora dos negócios afetados:
● Linha emergencial de crédito do BNDES com juros entre 1% e 4% ao ano;
● Prorrogação e flexibilização de contratos de câmbio de exportação;
● Adiamento de tributos federais por 120 dias, com parcelamento posterior sem multa ou juros;
● Pagamento imediato de créditos acumulados de PIS/Cofins e IPI;
● Ampliação do Reintegra para 3%;
● Reativação do Programa Seguro-Emprego;
● Ações contra práticas de dumping e reforço à defesa comercial.
Segundo a CNI, cerca de 700 produtos brasileiros serão isentos da tarifa de 50%. Entretanto, os setores importantes para a exportação brasileira ficaram de fora da lista de exceções. Entre os mais atingidos, estão:
● Proteína animal, café e etanol;
● Máquinas e equipamentos industriais;
● Produtos manufaturados e de alto valor agregado.
Os Estados Unidos são o principal destino das exportações da indústria de transformação brasileira, com destaque para pequenas e médias empresas. Segundo a CNI:
● Cada R$ 1 bilhão exportado em 2024 gerou 24,3 mil empregos e R$ 3,2 bilhões em produção nacional;
● O Brasil tem quase 3 mil empresas atuando nos EUA;
● Os investimentos brasileiros no país somam US$ 22,1 bilhões.
Para a CNI, o momento exige pressão coordenada entre setor produtivo e diplomacia governamental para evitar perdas duradouras. Como resposta diplomática, a CNI prepara uma missão empresarial aos Estados Unidos para sensibilizar o setor privado norte-americano. A intenção é mostrar que a tarifa afeta ambos os lados da relação comercial, com prejuízos diretos para cadeias produtivas e empregos.
"O nosso objetivo é abrir a conversa entre empresas brasileiras e americanas que sejam fornecedores ou clientes e vice-versa umas das outras. Nosso papel da CNI é ser um facilitador e um coordenador", reforçou Alban.
O presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Ricardo Alban, destacou que a missão empresarial que a instituição está organizando aos Estados Unidos busca aproximar empresas brasileiras e americanas que mantêm relações comerciais. “Nosso papel, da CNI, é ser um facilitador – um coordenador –, assim como nossa parceira, a U.S. Chamber of Commerce, nos Estados Unidos, também seja uma facilitadora. E o nosso objetivo não é fazer lobby, é fazer a sensibilização lá, para que as empresas americanas tenham sensibilização para o governo e vice-versa”, explicou Alban, nesta terça-feira (29).
A declaração ocorre em meio à expectativa pela entrada em vigor da tarifa de 50% sobre produtos brasileiros no mercado norte-americano, prevista para esta sexta-feira, 1º de agosto. Ricardo Alban defende que o diálogo entre empresas dos dois países pode criar pontes e contribuir para uma solução negociada, ainda que a decisão final dependa exclusivamente dos governos.
“Temos que aguardar o que vai acontecer de fato no dia 1º – se teremos a tão desejada suspensão ou a prorrogação [das medidas tarifárias] para que a gente possa ter um tom mais adequado dessas conversas”, acrescentou o dirigente.
A comitiva deve se reunir nas próximas semanas com empresas brasileiras que atuam no mercado norte-americano e com companhias dos EUA que mantêm relações comerciais com o Brasil. O objetivo é promover a sensibilização mútua sobre os impactos negativos do tarifaço e ampliar canais de interlocução, sem interferir diretamente nas negociações governamentais.
Alban destacou que, embora os Estados Unidos representem uma parcela menor das exportações brasileiras, o mercado americano é relevante para o setor industrial nacional, especialmente para pequenas e médias empresas, que não têm margem de manobra para enfrentar barreiras abruptas.
"Queremos encontrar bom senso. Não é simples, não é fácil, mas é possível, se focarmos no que converge”, concluiu.
Impactos esperados: empregos e PIB em risco
Durante reunião da diretoria da CNI na terça-feira, em Brasília, os representantes das federações industriais estaduais demonstraram forte preocupação com os efeitos da tarifa sobre cadeias produtivas locais. A Confederação estima que a medida pode causar:
● Perda de 110 mil empregos no Brasil;
● Redução de 0,16% no PIB nacional;
● Queda de 0,12% na economia global;
● Retração de 2,1% no comércio mundial, o equivalente a US$ 483 bilhões.
O aumento das tarifas de importação anunciado pelos Estados Unidos, com previsão de entrar em vigor em 1º de agosto, pode provocar perdas superiores a R$ 19 bilhões para os estados brasileiros, revela levantamento da CNI, com base no Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC).
O estudo mostra ainda os impactos nos estados com as maiores dependências do mercado norte-americano. Em 2024, os Estados Unidos representaram 44,9% das exportações do Ceará. No Espírito Santo, a participação foi de 28,6%. Em outros estados, como Paraíba (21,6%), São Paulo (19,0%) e Sergipe (17,1%), a dependência também é significativa.
O presidente da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (FIEC), Ricardo Cavalcante, afirmou que o estado poderá perder até 8 mil empregos com o tarifaço. Setores como aço, pescado, cera de carnaúba, castanha de caju e calçados estão entre os mais afetados.
“Temos mais de 6 mil barcos pescando no Ceará, cada um com 3 ou 4 tripulantes. Para cada pessoa no mar, há mais cinco em terra. Mais de 90% dos peixes vermelhos do estado vão para os EUA. Essa cadeia representa mais de 40 mil pessoas”, alertou Cavalcante, após reunião com o ministro Geraldo Alckmin e o governador Elmano de Freitas.
Outro levantamento da confederação mostra que há 2,9 mil empresas brasileiras com investimentos nos EUA, com destaque para JBS, Omega Energia, CSN, Bauducco e Embraer. Entre 2020 e 2025, 70 empresas brasileiras anunciaram novos projetos em território americano, somando US$ 3,3 bilhões.
O estoque de investimentos do Brasil nos EUA chegou a US$ 22,1 bilhões em 2024, crescimento de 52,3% em uma década. Em contrapartida, os investimentos dos EUA no Brasil somaram US$ 357,8 bilhões no mesmo ano, com 3,6 mil empresas americanas atuando no país.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou nesta quarta-feira (30) que o governo americano não fechou a porta para uma nova rodada de conversas. Segundo Haddad, a equipe do secretário do Tesouro dos EUA, Scott Bessent, pediu paciência até o retorno do secretário de viagem à Europa.
“Tenho tentado contato com ele. A assessoria dele sinalizou que há espaço para novo diálogo quando ele voltar”, disse Haddad.
Embora o clima ainda seja de incerteza, a expectativa é que o cenário possa mudar com pressão do setor produtivo e articulação política bilateral. A CNI mantém a posição de que a saída deve vir do diálogo — e não de medidas de confronto.
“O que mais revolta é pagar tanto imposto e não ter nenhum retorno”, desabafa Rodrigo Marrara, servidor público em Brasília, 54 anos. “Você paga imposto de renda, INSS e, mesmo assim, tem que pagar escola pros filhos, plano de saúde, previdência privada, transporte... O Estado simplesmente não entrega.” A sensação de Marrara é compartilhada por muitos brasileiros – e encontra respaldo em um número alarmante: os gastos públicos primários pagos pelo Governo Federal, Estados, Distrito Federal e Municípios já somam R$ 3 trilhões em 2025, marca atingida esta semana segundo o painel Gasto Brasil, da Associação Comercial de São Paulo (ACSP).
Instalado em pontos estratégicos do país — áreas centrais de São Paulo e de Salvador — e acessível pela internet, o painel contabiliza em tempo real as despesas dos entes federativos, numa iniciativa que busca jogar luz sobre o desequilíbrio estrutural das contas públicas. No ritmo atual, o gasto já ultrapassa com folga a arrecadação no mesmo período, aumentando o rombo fiscal e travando a recuperação econômica.
Para o presidente da Confederação das Associações Comerciais e Empresariais do Brasil, CACB, Alfredo Cotait, o Gasto Brasil é uma ferramenta de cidadania econômica.
“Nós criamos o Impostômetro há 20 anos para mostrar quanto pagamos de impostos. Agora, com o Gasto Brasil, mostramos para onde esse dinheiro está indo. O problema é que o gasto já passa dos R$ 3 trilhões e a arrecadação está em R$ 2,3 trilhões. Temos um déficit de R$ 700 bilhões.”
Segundo ele, a conta fecha com aumento de impostos, juros altos e retração de investimentos.
“É resultado da má gestão. Como não querem cortar gastos, querem arrecadar mais, mas ninguém aguenta mais. Estão afugentando investimentos. O empreendedor está sendo sufocado.”
O diagnóstico é corroborado por Cesar Lima, especialista em orçamento público, que defende o Gasto Brasil como ferramenta de conscientização. “Ajuda o brasileiro a perceber o custo real do Estado. Mas quando você olha os números, vê que dois terços do gasto são previdência. Talvez uma nova reforma da Previdência seja inevitável.”
Lima também destaca a má alocação dos recursos públicos: “Gasta-se muito e gasta-se mal. A população não percebe retorno nos serviços. Saúde, educação, infraestrutura — tudo precário. E isso alimenta o descrédito na política fiscal.”
De fato, segundo a Instituição Fiscal Independente (IFI), mesmo com o novo regime fiscal em vigor, o governo federal deve encerrar o ano com déficit primário superior a R$ 80 bilhões. E o cenário para 2026 é ainda mais preocupante, com previsão de rombo de R$ 79 bilhões, o que exigiria forte contingenciamento das despesas públicas.
A expectativa é que a reforma administrativa, cujo relator é o deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), avance no Congresso no segundo semestre. A proposta incluirá digitalização, avaliação de desempenho e unificação de carreiras. Para Cotait, é preciso coragem política.
“A sociedade não pode mais aceitar que reformas estruturais fiquem engavetadas por pressões corporativas. Se queremos um país mais competitivo, precisamos de um Estado mais leve e eficiente.”
Enquanto isso, o painel do Gasto Brasil segue rodando — um lembrete permanente de que a conta não fecha e de que a fatura sempre acaba no bolso do contribuinte.
Inspirado no Impostômetro, o Gasto Brasil é uma plataforma pública criada pela ACSP e pela CACB para monitorar, em tempo real, os gastos do governo federal, dos estados e dos municípios. A ferramenta busca ampliar a transparência e permitir que qualquer cidadão fiscalize como os recursos arrecadados são utilizados. Está disponível online, no site www.gastobrasil.com.br.